Um dos melhores do mundo não desce aos relvados

Diário Económico entrevista Paulo Rebelo.

Isabel Lucas, 20/12/2011 09:40

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Aos 28 anos, Paulo Rebelo vive entre Porto, Madrid e Londres e ganha na bolsa das apostas desportivas ‘online’ o que poucos ‘traders’ conseguem na bolsa tradicional.

Não é sorte. É ciência. Não é técnica, é estudo aplicado à lei das probabilidades. E não há paixão, há sangue frio e concentração total.

Paulo Rebelo tem 28 anos, guia pelas ruas que levam do aeroporto de Heathrow ao estádio de Wimbledon, mas o sotaque cerrado é do Porto. Não vai haver jogo, mas é naquele cenário de estádio que trabalha há quatro anos, desde que trocou a bolsa tradicional pela bolsa de apostas desportivas ‘online’.

Sem revelar rendimentos, ganha mais do que um quadro superior de uma grande empresa, não cumpre outros horários que não sejam o da partida que lhe interessa e sobra-lhe tempo para viajar, jogar PlayStation, estar como a família ou entrar em campo em jogos amigáveis.

Quando lhe perguntam exactamente o que faz, diz: “o meu trabalho consiste em ver um jogo de futebol e traduzi-lo em probabilidades”.

Quando a família quer explicar aos outros o que faz o filho, diz simplesmente que trabalha na Internet por não conseguir entender o que a maior parte das pessoas também não consegue.

Ou seja, como é que aos 28 anos se ganha o dinheiro suficiente para ter uma casa em Londres, outra em Madrid, outra no Porto e vários carros de grandes cilindradas. Tudo sem tirar os olhos de um jogo de futebol e agarrado ao um computador.

Paulo Rebelo é ‘trader’, um gestor de activos financeiros, registado na casa de apostas inglesa Betfair e aplica ao futebol as mesmas regras e a experiência acumulada durante oito anos a trabalhar na bolsa.

Primeiro experimentou os cavalos, o ténis, o basquetebol ou o futsal, mas decidiu-se pelo futebol. Era o que permitia ganhar mais dinheiro, aquele onde juntava a liquidez ao conhecimento acumulado durante anos enquanto adepto. Isto é, onde o grau de sacrifício para conseguir lucro era menor.

Um cientista das apostas

Sem dispersar atenções, tornou-se especialista num tipo de jogo. “A minha filosofia é a da especialização”, sublinha. Aí, diz-se um estudioso, um cientista das apostas, alguém que analisa ao mais pequeno pormenor as diferentes estratégias que permitem ganhar dinheiro.

Lançar uma hipótese, testá-la e finalmente validá-la ou simplesmente rejeitar. E joga com o dinheiro dos outros para reduzir o risco dele quase ao zero.

Isso mesmo. Paulo Rebelo ganha dinheiro a vender as apostas dos outros, dos que confiam na sua ciência, e não no seu instinto, que Paulo não gosta de ver ser para aqui chamado.

É um profissional, está sempre a lembrar. “Ao contrário dos apostadores simples, os ‘traders’ conseguem ganhar dinheiro não com a aposta, mas com a variação da aposta”, explica. Para isso trabalha em ‘full time’.

Analisa um jogo e desmonta-o em probabilidades. Estuda o mercado e prevê o seu comportamento.

Não importa se uma equipa está a ter um percurso vencedor. Importa se o mercado está a apostar nela.

Paulo escolhe o jogo que vai seguir, lê tudo o que pode sobre ele e pouco antes de a partida começar instala-se na cadeira giratória em frente do ecrã que tem em casa. É aí que tudo acontece.

Ontem (no calendário desta conversa) foi dia de Benfica-Basileia, mas Paulo Rebelo ligou a televisão no Real Madrid-Lion. Era neste jogo que ia trabalhar. Razão? Há mais espectadores, logo mais dinheiro a correr entre o universo dos apostadores ‘online’.

Paulo não revela quanto ganhou ao longo de uma partida onde pode ter dado umas mil ordens de compra e venda. “Não é apenas o resultado que interessa ou que gera dinheiro.

Todos os incidentes em jogo permitem liquidez, todas as variáveis entram no raciocínio do apostador. Se a equipa está a atacar, se os jogadores estão ou não motivados, se mudou o treinador”, explica sem tirar os olhos da estrada, tal qual como quando está de olhos postos num ecrã gigante onde se engana quem pensa que ele é apenas um espectador viciado no jogo.

O Benfica sobe a adrenalina e baixa os lucros

Erro crasso. “Raramente aposto no Benfica”, confessa. É que além de movimentar muito menos dinheiro do que outra equipa da Liga Inglesa ou da Liga Espanhola, as que geram mais receitas por serem vistas em todo o mundo, o clube da Luz é aquele pelo qual torce este rapaz do Porto que vem ainda lembrar que a emoção não é boa conselheira, ou, numa linguagem mais técnica, a emoção não maximiza o lucro.

“Os níveis de adrenalina sobem e falta a frieza na decisão. O Benfica já me fez perder muito dinheiro”, declara com um sorriso meio amarelo estampado no retrovisor, lembrando um erro do “amigo” Roberto, o guarda-redes, que deixou a bola entrar na baliza e o acabou empatado, Paulo a perder uns dois ou três mil euros, se a memória não lhe falha.

Se falhar, há o ‘site’ para o lembrar desse jogo “de má sorte” ou “erro de cálculo” da Liga dos Campeões, “valor relativamente pequeno para a banca” que normalmente utiliza, salienta.

Portanto, sorte e azar, só nos ‘frangos’ dos guarda-redes. Aí entram a par com outras variáveis que permitem não deitar tudo a perder.

Sem revelar quanto ganhou nas menos de duas horas em que durou o Real Madrid-Lion para a Liga dos Campeões, conta o seu recorde mais recente: 36 mil euros que foram parar à sua conta no Porto, onde um dia gostava de ficar sem ter de andar com as malas às costas para estar mais perto do sítio onde as coisas acontecem e haver um acesso mais fácil à informação sobre os jogos que está a seguir e ser tão rápido quanto possível a dar ordens de compra e venda.

Para que o sonho de ficar no Porto se concretizasse, seria preciso que a Liga Portuguesa se tornasse mais competitiva, que houvesse mais gente a ver, logo, mais apostas e dinheiro a rodar, e que a actividade estivesse regulamentada.

Ao contrário do que possa parecer, Paulo Rebelo não se sente nem um pouco contaminado pelo cosmopolitismo de Londres nem pela ‘movida madrileña’.

Aos restaurantes étnicos continua a preferir o bife com batatas e arroz feito pela namorada. Também não troca uma partida de futebol com os amigos por uma ida ao Carneghie Hall.

“Tenho gostos simples”, justifica como se fosse preciso a alguém que é considerado na casa de apostas onde está inscrito um dos melhores jogadores ‘online’ do mundo, o que trocado por dinheiro significa não ter de se preocupar muito com a liquidez das suas contas apesar de ter alguns gostos caros, como os carros que lhe vão enchendo as garagens e o fazem ter no mecânico um dos contactos mais preciosos deste apostador profissional.

MERCADO PARA TODOS MAS NÃO PARA QUALQUER UM

Diz que o trabalho mudou a sua personalidade. Indisciplinado, nervoso, emotivo, passou a ser calmo, disciplinado, emocionalmente controlado. Era a única maneira para poder ganhar dinheiro, levar o mais a sério possível uma profissão que pede sangue frio. O dinheiro era o seu objectivo, única maneira de ter a qualidade de vida que queria sem ter de dar contas as patrões e tendo tempo para ele e para as coisas de que gosta.

Além de perceber de futebol, há que perceber o mercado, explica. E explica melhor remetendo para o ‘site’ que criou para divulgar e promover a sua carreira enquanto ‘trader’, um pequeno manual de comportamento para jogadores em início de carreira, para os que já seguem há muito os seus conselhos.

Em www.paulorebelo.trader.co fazem-se análises de jogos, dão-se dicas, prognósticos, relatos das apostas mais emocionantes e das experiências que hão-de ficar para a história do mundo da especulação ‘on-line’.

Quando o que chama um “jogo de valor esperado positivo”, divide a análise com a ‘sua’ comunidade de apostadores. Gera-se dinheiro a partir de dinheiro e fica-se a saber que “nesta altura, a rentabilidade dos prognósticos de Paulo Rebelo é de 1407%”. “Isto significa que quem abriu a conta através do nosso ‘site’ com 30 euros e apostou sempre 30 euros já ganhou 422,1 euros”.

Versão impressa do Jornal Económico de dia 9 de Dezembro:

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